Sem controle

terça-feira, julho 26, 2011

Faltava alguma legitimidade para que a Nega entrasse na disputa pelo amor de Lilu, quando se aproximava o final das férias conjugais da flor de cajueiro. Todas as suas armas haviam sido posicionadas no jogo de sedução e, naquele momento, nem o carinho, nem a compreensão dedicada ‒ muito menos o sexo ‒ impediriam sua amada de trilhar o recorrente caminho de volta.

Sempre houve o risco, as previsões do óbvio não eram escassas, e ainda assim existia a esperança da Nega, indissociada da paixão. Porque muito mais o desespero da ausência do que a dor da perda a conduziria à dissimulação do controle da situação.

No entanto, a fragilidade da farsa provocava movimentação instável de idas e vindas, quase uma dança cega de improviso orientada pelo coração. A primeira manifestação de insensatez dessa natureza teve potencial para fazer ruir sentimentos ainda não estruturados, quando cheia de rodeios e timidez, sentada na grama do parque, ela se ouve dizer algo impetuoso: “Quero ser sua mulher”. Lilu respirou aliviada porque, por alguns minutos, pensou que fosse presenciar, com despreparo, um anúncio precoce de despedida.

Mas à medida que crescia desavisado o amor no peito da Nega, para não botar tudo a perder antes do tempo, em seguida retrocedeu, declarando enquanto Lilu dirigia: “Não quero mais ser sua mulher; porque não posso”. Em silêncio, um suspiro trazia novo alívio à flor de cajueiro, que vislumbrava veredas cada dia mais abertas para seu eterno retorno, enquanto acompanhava atenta à construção do fim sem intervenção, apenas deixando rolar.  

Uma das últimas simulações do controle fake da Nega sob sua breve história romântica com Lilu é o conteúdo da oitava mensagem na garrafa, desenhada pelo artista plástico Mateus Dutra, e distribuída em Santiago, no Chile, com a colaboração da bailarina mexicana Martha Cano.

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